Por Saulo Pereira Guimarães
"Fica declarado como patrimônio cultural de natureza imaterial do Rio de Janeiro a Saideira de Bar". Assim mesmo, em caixa alta. É o que determina o projeto de lei 2125 de 2023, aprovado pela Câmara Municipal no último dia 30. Agora, para virar lei, a proposta só depende do bem provável ok do atual prefeito Eduardo Paes. O improvável autor do texto foi o ex-prefeito Cesar Maia que, de todos os vereadores da cidade, deve ser um daqueles com menos saideiras no currículo. Mas não faz mal. Afinal, isso lhe deu sobriedade suficiente para entender o dever de preservar esse derradeiro bem dos cariocas.
"A 'saideira de bar' representa o povo carioca mais que a qualquer outro", argumenta o Cesar Maia na justificativa do projeto. Assim mesmo, entre aspas. Porque saideira é, por natureza, coisa informal, descontraída. Dizer que ela representa o povo carioca mais que a qualquer outro pode até ser exagero. Mas o fato é que o desejo de tombá-la surgiu à beira da Guanabara antes do que no restante do planeta. Inclusive, deixo aqui a pergunta: existe saideira fora do Brasil? Que eu saiba, saideira é coisa nossa, tanto quanto a moca, a troça, a fofoca, as bibocas e outras bossas. Quem souber, avise.
"A cidade gira dia e noite na expectativa do próximo copo", continua o Cesar Maia. Pessoalmente, eu acho que, se a cidade gira, é bom pedir logo a saideira, porque já deve ser hora de parar. "Do próximo drink, do próximo assunto a ser discutido, do próximo sorriso", ele segue. Vocês imaginam o Cesar Maia, com seu indefectível casaquinho azul-marinho, os cabelinhos ralos na cabeça branca, escrevendo uma frase dessas? Se, pelo menos, ainda fosse o Conde. "Do próximo novo amigo de infância que será conhecido", conclui. E aqui eu paro, porque chegamos ao que, de fato, interessa, o cerne da questão.
Por si só, beber não tem graça. Ou, pelo menos, não é para ter e se tem para você, procure seu médico. A graça de beber — especialmente saideiras — está em se beber cercado de gente a quem se queira bem — pelo menos, naquele momento — falando sobre temas que mantenham a conversa acesa como uma fogueira — ainda que, no instante seguinte, eles possam não fazer nenhum sentido. Só assim se faz novos amigos de infância. E, do contrário, não é saideira. É happy hour, networking ou meeting qualquer com outra finalidade. Conversa de bar — e, consequentemente, saideira — tem que ser assim.
"A 'saideira de bar' prorroga os bons momentos", filosofa Cesar Maia — como se fosse madrugada e ele esperasse o último chopp da noite no Lamas ou no Capela. Ele diz que, no Rio, os bons momentos podem começar nas praias e terminar no bar do vizinho próximo de casa ou "nas baladas intermináveis que acontecem por uma das cidades mais vibrantes do planeta". Aqui, a única incongruência do ex-prefeito, visto que baladas intermináveis impedem, por definição, as saideiras — revelando o caráter educativo do novo patrimônio. As saideiras existem para nos ensinar que tudo termina e que o fim pode ser bom.
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A "SAIDEIRA" perfeita é aquela que cada dose ou garrafa de cerveja é representada por uma letra do seguinte pedido. "POR FAVOR traga a SASASASASASASAIIIIIIIIIIIIDEIDEIDEiDEiDEiRAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA".