Carreira solo
Como pirataria e outros fenômenos derrubaram o Pagode do topo das paradas?
E se o Pagode virasse um programa de TV? Essa foi a ideia da Globo para bater Raul Gil aos sábados em 1999. Com Netinho e Salgadinho, "Samba, Pagode & Cia" estreou em 27 de março misturando roda de samba em estúdio com show gravado às pressas — sem sucesso. A Globo tentou salvar a atração. Uma mansão com garçons como cenário, Alexandre Frota como convidado e uma novelinha com Milton Gonçalves e Kelly Almeida — em breve, Kelly Key — foram algumas das mudanças. Mas nenhuma funcionou e o programa foi encerrado em 15 de maio. "Fazer pagode tomando champanhe não dá certo", diria Netinho, anos depois.

Em 2000, a MTV gastou R$ 2 milhões para gravar um Acústico com o Art Popular. Porém, piano, coral e mais de 20 músicos contratados só garantiram a venda de 400 mil cópias. Não era um fenômeno isolado. O Pagode já não vendia mais tanto quanto antes. Entre 1997 e 2001, a fatia de mercado dos CDs piratas saltou de 3% para 50% do total no Brasil, turbinada por camelôs com preços até 10 vezes menores do que os praticados nas lojas. Para um ritmo essencialmente popular, era um baque importante. O Bokaloka, por exemplo, acabou nacionalmente conhecido graças a uma gravação ilegal de um show.
Mas o golpe de misericórdia mesmo veio das gravadoras. Diante do mercado saturado e cada vez menos rentável, elas decidiram lançar vocalistas em carreira solo. Era um jeito de reduzir custos e garantir lucro. O primeiro da fila foi Belo, que deixou o Soweto em 2000. Seu 1º disco solo vendeu mais de 1 milhão de cópias. Em 2001, Netinho saiu do Negritude Jr. e Alexandre Pires, do Só Pra Contrariar. O primeiro ganhou programa de TV e, em 2008, foi um dos vereadores mais votados de São Paulo. Já o segundo se tornou um cantor romântico de sucesso global. Mas as mudanças deixaram o Pagode em 2º plano.
O ritmo nunca deixou de emplacar artistas de peso. Um exemplo é o grupo Revelação, que teve o 2º disco mais vendido do ano em 2002 e levava 4 mil pessoas por semana a um pagode no Olimpo à época. No mesmo período, Gustavo Lins emplacou cinco músicas entre as 100 mais executadas do país. Em 2012, o álbum “Sorriso 15 anos Ao Vivo”, do Sorriso Maroto, foi um dos três mais comercializados no Brasil. Em São Paulo, Jeito Moleque e Inimigos da HP foram ícones do Pagode Universitário, vertente protagonizada por alunos do Mackenzie e outras instituições fascinados pelas criações dos jovens de periferia.
Quem quiser ouvir um Pagode nos dias de hoje pode procurar por Dilsinho, Ferrugem, Ludmilla ou Menos é Mais no Spotify ou outra plataforma. Eles são os melhores herdeiros de uma tradição mais que centenária — forjada no batuque dos escravizados, trazida do Rio para a Bahia e finalizada em terras paulistanas. Pouco contada, a história do Pagode é a história de um encontro bem-sucedido entre a manifestação artística mais popular do Brasil — o Samba — e a cultura de massa do século XX. É uma história que deixou saudades e lições para quem a viveu e que está longe de acabar. Viva o Pagode!
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A história do pagode é um ensaio em quatro capítulos sobre o gênero musical que colocou no mesmo ritmo as duas pontas da Dutra -- exclusivo para assinantes da Eixo.
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Ótima matéria! Lembro bem da época da pirataria. Quanto prejuízo!
Muito boa leitura!!! E eu sem fone de ouvido no trabalho hoje...